texto extraído do site www.ajufe.org.br
Ajufe alerta para os prejuízos do PAC ao funcionamento da Justiça Federal
(27/02/2007 - 16:27)
A Justiça Federal terá o funcionamento comprometido caso seja aprovado um dos projetos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) encaminhados pelo governo ao Congresso Nacional. O alerta foi feito pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), em ofício encaminhado por seu presidente, Walter Nunes, ao relator e presidente da Comissão Especial da Câmara dos Deputados destinada à discussão do PAC. O mesmo documento foi enviado ao presidente da Câmara dos Deputados, Arlindo Chinaglia, e ao ministro do Planejamento, Paulo Bernardo.
O Projeto de Lei Complementar (PCL nº 1/2007), que acrescenta um artigo à Lei de Responsabilidade Fiscal, inviabilizará a aprovação dos projetos encaminhados ao Congresso Nacional como forma de solucionar os crescentes gargalos da Justiça Federal, pois esta terá todo plano estratégico de crescimento comprometido até o ano 2016. No ofício são citados os projetos de criação de varas federais (PL 5829/05), estruturação das Turmas Recursais e Corregedorias (PL nº 4694/04) e de criação de novos Tribunais Regionais Federais (PEC 544/2002).
Segue a íntegra do documento:
“A Associação dos Juízes Federais do Brasil – AJUFE, na qualidade de instituição de classe que tem dentre as suas atribuições a luta contínua pela defesa e o aprimoramento do Poder Judiciário, manifesta preocupação e alerta Vossa Excelência para os graves prejuízos ao funcionamento da Justiça Federal representados pelo Projeto de Lei Complementar nº 1/2007, que introduz o art. 71-A na Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000), encaminhado pelo Presidente da República como parte do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC. A referida iniciativa legislativa, contrariando os fins do referido Programa, impede a expansão/crescimento da Justiça Federal até o ano de 2016 e, de permeio, apresenta vício de inconstitucionalidade, pois compromete, na substância, a autogestão do Poder Judiciário, com evidente malferição ao pacto constitucional da independência dos poderes.
Na hipótese de vir a ser aprovado, sem as devidas alterações no Parlamento, o Projeto de Lei em foco irá impedir, nos próximos nove anos, a aprovação de projetos da Justiça Federal de criação de varas federais (PL 5829/05), estruturação das Turmas Recursais e Corregedorias (PL nº 4694/04), criação de novos Tribunais Regionais Federais (PEC 544/2002) e aumento do número de membros dos Tribunais Regionais Federais, em estudo no Conselho da Justiça Federal – CJF.
A proposta trará inequívocos prejuízos à coletividade. Não se pode desconsiderar a necessidade de controle das despesas públicas, mas os mecanismos adotados para esse fim não podem ser estabelecidos ao arrepio da Constituição, em especial do princípio constitucional da separação e, até mesmo, da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII), introduzido pela EC nº 45/04. Ou seja, o controle das contas não se fará com um Poder Judiciário moroso e desaparelhado em estrutura e recursos humanos, incapaz de satisfazer a sede de justiça da sociedade brasileira.
Muito embora a tônica no Brasil seja falar-se da necessidade de reforma do Judiciário, especialmente em razão de sua incapacidade estrutural de atender em tempo razoável às demandas dos jurisdicionados, a Justiça Federal, entre os anos de 2004 a setembro de 2006, ou seja, em pouco mais de dois anos, viabilizou o pagamento de quase 17 bilhões de reais .
Os pagamentos efetuados por meio de precatórios, decorrentes de condenações da Justiça Federal, foram as seguintes :
2004: R$ 1.979.107.791,00
2005: R$ 2.353.957.038,00
Até setembro de 2006: R$ 3.544.801.298,00
Já as despesas totais com o pagamento de requisições de pequeno valor são as seguintes:
2004: R$2.691.206.995,00
2005: R$ 3.876.453.427,00
Até setembro de 2006: R$ 2.284.806.775,00
Número de beneficiários: 523.600 623.495 474.375Número de processos: 346.672 466.980 328.654 Valor médio/beneficiário 5.139,81 6.217,30 4.816,46
Conclui-se do quadro acima que houve crescimento de 44% no volume de recursos pagos entre 2004 e 2005. Mais de um milhão e meio de pessoas foram beneficiadas no período de 2004 a setembro de 2006, em condenações que ficam, na média, em torno de R$ 5 mil, o que demonstra a dimensão social da atuação da Justiça Federal.
Sem embargo da eficiência demonstrada pela leitura dos dados acima, conforme os indicadores estatísticos que constam do banco de dados Justiça em Números, gerido pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ, a Justiça Federal, quando comparada com as Justiças Estadual e do Trabalho, é sobremaneira pequena quanto ao número de órgãos e juízes, embora o seu estoque de processos seja equivalente aos desses dois segmentos do Poder Judiciário. A Justiça Federal possui apenas 1.315 juízes, enquanto a Justiça Estadual tem 10.530 juízes e a do Trabalho, 2.763. Por outro lado, são 27 Tribunais de Justiça, 24 Tribunais Regionais do Trabalho e apenas cinco Tribunais Regionais Federais, de modo que são 1.431 desembargadores estaduais, 486 desembargadores do trabalho e apenas 139 desembargadores federais. Isso decorre do fato de as Justiças Estadual e do Trabalho, já há algum tempo, terem implementado os seus projetos de expansão, especialmente quanto ao processo de interiorização, mediante a criação de varas nas cidades do interior e nas periferias das grandes cidades.
Essas considerações, por si só, demonstram que a expansão da Justiça Federal é necessária e urgente, a fim de que seja possível aprimorar a prestação da atividade jurisdicional em um País marcado por desigualdades sociais e que, para piorar, e muito, essa situação, infelizmente tem o Poder Público como o seu litigante-mor.
Se no Brasil a litigiosidade alcança a impressionante cifra de pouco mais de 30 milhões de ações , mais de 10,7 milhões são só na Justiça Federal . Havia, em setembro de 2006, em primeira instância, 1.208 cargos providos de juiz federal e, na segunda instância, 136 cargos providos de desembargador federal. Sendo assim, é obtida a média de 8.055 processos por magistrado no primeiro grau e 6.985 processos por magistrado de segundo grau.
Registre-se, por oportuno, que o número excessivo de feitos por magistrado se dá pelo aumento de ações novas distribuídas. A distribuição na primeira instância, em 1998, foi de 838.643 ações, pulando para 2.538.362 no ano de 2005, perfazendo aumento de mais de 200%. Nos Juizados Especiais, o cenário é mais grave: foram ajuizadas 213.709 ações em 2002, número que atingiu 1.421.702 em 2005, em crescimento de quase 600%. Nas turmas recursais, foram 172.743 recursos distribuídos em 2004, montante que atingiu 315.346 no ano de 2005, apurando-se crescimento de mais de 100%. Nos tribunais, houve incremento de 46% no período de 1995 a 2005, passando, respectivamente, de 285.749 para 409.274 novos recursos aforados.
Aliado ao crescente número de novos processos, houve expressivo incremento na produtividade dos magistrados. Na primeira instância, excluídos os Juizados Especiais Federais, a relação entre processos distribuídos e processos julgados passou de 59%, em 1998, para 79%, em 2005. Nos Juizados Especiais Federais, a proporção foi de 77% para 94% no período de 2002 a 2005. Nas turmas recursais, entre 2004 e 2005 o percentual elevou-se de 66% para 94%. Nos Tribunais Regionais Federais, a relação foi de 69% em 1995, atingindo 102,5% em 2005.
Nos tribunais, uma das medidas adotadas para atender a alta demanda tem sido a convocação de juízes federais de primeira instância para o auxílio aos magistrados de segundo grau, regulado pela Resolução nº 210 do CJF. A solução foi oportuna, mas, a longo prazo, como verificado na prática desde 2000, teve reflexos negativos sobre a primeira instância, uma vez que o juiz convocado deixa de cuidar dos processos de sua vara. Ademais, na maioria das vezes, a estrutura utilizada pelos juízes em auxílio é a de suas varas, desfalcando de modo sobremaneira a prestação jurisdicional no primeiro grau. Esse aspecto, inclusive, foi bem salientado pelo Ministro Ari Pargendler do Superior Tribunal de Justiça, então coordenador-geral da Justiça Federal, ao encaminhar para o colegiado proposta de ampliação do número de membros das cortes regionais.
Cabe registrar a situação vivenciada pelos Juizados Especiais Federais, previstos pela Lei nº 10.259/01, sem a criação dos necessários cargos para o seu funcionamento, o que foi em parte equacionado pela Lei nº 10.772/03. O mesmo não se pode dizer das Turmas Recursais, até o momento não dispondo de estrutura adequada para atuação, porquanto ainda não foram criados os cargos dos juízes que atuam nesses órgãos.
Observa-se que o aumento substancial da produtividade dos juízes federais não se mostra suficiente para a diminuição do acervo de processos, pois a estrutural atual é insuficiente para dar conta do estoque de ações.
O mais preocupante é que, caso não seja promovida a necessária expansão/crescimento da Justiça Federal, em curto espaço de tempo o seu funcionamento estará irremediavelmente comprometido, em prejuízo de milhares de pessoas que necessitam de seus serviços para uma existência digna, como são os casos dos segurados da previdência social e mutuários do sistema financeiro da habitação, os maiores clientes dos juizados especiais federais.
Um dos principais obstáculos à ampliação da Justiça Federal de primeiro e segundo graus era de ordem financeira, considerando os limites de gastos com pessoal da Lei de Responsabilidade Fiscal, materializados na Resolução nº 05 do CNJ. Assim é que apresentado pela AJUFE o Pedido de Providências nº 165, a partir de coordenação da Ministra Ellen Gracie, Presidente do Supremo Tribunal Federal, e do Ministro Raphael de Barros Monteiro, Presidente do Superior Tribunal de Justiça, com os demais Presidentes de Tribunais Superiores, equacionou-se o problema definitivamente, arbitrando-se à Justiça Federal margem de expansão condizente com suas necessidades, como se observa da Resolução nº 26/2006.
Sobre a necessidade de serem assegurados recursos indispensáveis ao crescimento da Justiça Federal, merece destaque o voto do Ministro Vantuil Abdala, Conselheiro do Conselho Nacional de Justiça, relator do Pedido de Providências 165:
(...)19. As necessidades atuais da Justiça Federal autorizam seja realizada nova readequação nos limites da Resolução na 05 do CNJ, até porque a disponibilidade orçamentária em vigor inviabiliza até a implantação do Plano de Cargos e Salários dos servidores, em prejuízo de todo o Poder Judiciário Nacional.2O. Em reunião administrativa realizada no Supremo Tribunal Federal; em 04/12/2006, Presidida pela Ministra Ellen Gracie e dom a presença dos Presidentes do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Superior do Trabalho, ficou acertada a necessidade de se readequar os percentuais dos limites de despesas com pessoal e encargos dos diversos órgãos integrantes da Resolução nº 5, sob pena de se inviabilizar o processo futuro de ampliação dos diversos segmentos do Poder Judiciário.(..)
Note-se que o Conselho Nacional de Justiça, criado pela EC nº 45/04, é o órgão central de coordenação e planejamento do Poder Judiciário. Esse órgão já identificou as carências existentes na Justiça Federal de primeiro e segundo graus e determinou as providências indispensáveis à alocação de recursos indispensáveis ao seu crescimento.
Há em tramitação dois projetos de lei no Congresso Nacional que cuidam da ampliação da Justiça Federal: o PL nº 4694/04 e o PL 5829/05, tratando, respectivamente, da estruturação das Turmas Recursais e Corregedorias e da criação de Varas Federais. Resta, ainda, o Projeto de Emenda Constitucional nº 544/2002 e o projeto de aumento do número de membros dos Tribunais Regionais Federais, em estudo pelo Conselho da Justiça Federal.
Ocorre que uma das medidas anunciadas no Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, foi a proposta de introdução do art. 71-A a Lei de Responsabilidade Fiscal (LC nº 101/00), nos seguintes termos:
“Art. 71-A. A partir do exercício financeiro de 2007 e até o término do exercício de 2016, a despesa com pessoal e encargos sociais da União, para cada Poder e órgãos referidos no art. 20, não poderá exceder, em valores absolutos, ao valor liquidado no ano anterior, corrigido pela variação acumulada do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA, ou o que venha a substituí-lo, verificado no período de doze meses encerrado no mês de março do ano imediatamente anterior, acrescido de um e meio por cento.”
Na prática, essa medida, que está encartada no PLC 1/2007, importa restrição absoluta ao crescimento da Justiça Federal, impedindo-a de prestar adequadamente a jurisdição.
Os números de distribuição e julgamento de processos antes referidos, nas duas instâncias e nos Juizados Especiais Federais demonstram que a estrutura da Justiça Federal trabalha no limite de sua capacidade.
Ora, ao autorizar o índice de aumento da despesa de pessoal sobre os valores absolutos liquidados do exercício anterior, pela variação do IPCA (até março do exercício anterior) acrescido de 1,5%, no período de 2007 a 2016, o projeto de lei complementar se mostra mais restritivo do que o legislador originário da Lei de Responsabilidade Fiscal, que previu a margem de expansão de 10% nos três primeiros exercícios subseqüentes à vigência da citada lei.
A média histórica do IPCA no período de 2004 a 2006 foi a seguinte:
2004: 7,60%2005: 5,69%2006: 3,14%
Do quadro acima conclui-se que a variação do IPCA reduziu-se em mais de 100% no período de 2004 a 2006 e esse percentual permanece em declínio constante. Assim sendo, a margem prevista pelo art. 71-A do projeto em causa ficará muito abaixo dos 10% originais e prudentemente estabelecidos na Lei de Responsabilidade Fiscal. Pode-se chegar a variação negativa do índice a reclamar, na contramão do exposto, a inconseqüente redução da despesa.
Some-se a isso o fato de o projeto agregar aos valores globais de despesa com pessoal o gasto com pessoal terceirizado, agora colocado de forma expressa no § 3º do projeto, restringindo mais ainda os encargos globais com pessoal qualificado e especializado, indispensável ao bom desempenho da Justiça como um todo.
Assim sendo, o que se propõe é que o projeto de lei complementar ressalve os projetos de lei de ampliação da Justiça Federal, quais sejam: o de criação de varas federais (PL 5829/05), de estruturação das Turmas Recursais e Corregedorias (PL nº 4694/04), de criação de novos tribunais regionais federais (PEC 544/2002) e o projeto de aumento do número de membros dos Tribunais Regionais Federais, em estudo pelo Conselho da Justiça Federal. Além disso, também de modo a evitar restrições ao crescimento futuro da Justiça Federal, o art. 71-A proposto deve substituir o percentual de 1,5% pelo percentual de 10%.
Com essas alterações, a ser promovidas pelo Poder Legislativo no cumprimento de sua missão constitucional, contorna-se o vício de inconstitucionalidade do Projeto de Lei Complementar nº 1/2007, porquanto não impede a programação estratégica do Poder Judiciário. Por outro lado, preserva-se a essência do PAC, qual seja, a adoção de medidas para a promoção do crescimento, sem, com isso, comprometer de forma inaceitável os relevantes serviços sociais, econômicos e políticos prestados pela Justiça Federal, principalmente quanto ao atendimento das demandas encaminhadas pelas pessoas mais carentes, ávidas quanto ao reconhecimento de seus direitos mínimos, indispensáveis para assegurar uma vida com alguma dignidade.
Por oportuno, apresento a Vossa Excelência, em nome da Associação dos Juízes Federais do Brasil – AJUFE, a nossa mais alta admiração e estima.
Atenciosamente,
Walter Nunes da Silva JúniorPresidente da Ajufe
(27/02/2007 - 16:27)
A Justiça Federal terá o funcionamento comprometido caso seja aprovado um dos projetos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) encaminhados pelo governo ao Congresso Nacional. O alerta foi feito pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), em ofício encaminhado por seu presidente, Walter Nunes, ao relator e presidente da Comissão Especial da Câmara dos Deputados destinada à discussão do PAC. O mesmo documento foi enviado ao presidente da Câmara dos Deputados, Arlindo Chinaglia, e ao ministro do Planejamento, Paulo Bernardo.
O Projeto de Lei Complementar (PCL nº 1/2007), que acrescenta um artigo à Lei de Responsabilidade Fiscal, inviabilizará a aprovação dos projetos encaminhados ao Congresso Nacional como forma de solucionar os crescentes gargalos da Justiça Federal, pois esta terá todo plano estratégico de crescimento comprometido até o ano 2016. No ofício são citados os projetos de criação de varas federais (PL 5829/05), estruturação das Turmas Recursais e Corregedorias (PL nº 4694/04) e de criação de novos Tribunais Regionais Federais (PEC 544/2002).
Segue a íntegra do documento:
“A Associação dos Juízes Federais do Brasil – AJUFE, na qualidade de instituição de classe que tem dentre as suas atribuições a luta contínua pela defesa e o aprimoramento do Poder Judiciário, manifesta preocupação e alerta Vossa Excelência para os graves prejuízos ao funcionamento da Justiça Federal representados pelo Projeto de Lei Complementar nº 1/2007, que introduz o art. 71-A na Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000), encaminhado pelo Presidente da República como parte do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC. A referida iniciativa legislativa, contrariando os fins do referido Programa, impede a expansão/crescimento da Justiça Federal até o ano de 2016 e, de permeio, apresenta vício de inconstitucionalidade, pois compromete, na substância, a autogestão do Poder Judiciário, com evidente malferição ao pacto constitucional da independência dos poderes.
Na hipótese de vir a ser aprovado, sem as devidas alterações no Parlamento, o Projeto de Lei em foco irá impedir, nos próximos nove anos, a aprovação de projetos da Justiça Federal de criação de varas federais (PL 5829/05), estruturação das Turmas Recursais e Corregedorias (PL nº 4694/04), criação de novos Tribunais Regionais Federais (PEC 544/2002) e aumento do número de membros dos Tribunais Regionais Federais, em estudo no Conselho da Justiça Federal – CJF.
A proposta trará inequívocos prejuízos à coletividade. Não se pode desconsiderar a necessidade de controle das despesas públicas, mas os mecanismos adotados para esse fim não podem ser estabelecidos ao arrepio da Constituição, em especial do princípio constitucional da separação e, até mesmo, da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII), introduzido pela EC nº 45/04. Ou seja, o controle das contas não se fará com um Poder Judiciário moroso e desaparelhado em estrutura e recursos humanos, incapaz de satisfazer a sede de justiça da sociedade brasileira.
Muito embora a tônica no Brasil seja falar-se da necessidade de reforma do Judiciário, especialmente em razão de sua incapacidade estrutural de atender em tempo razoável às demandas dos jurisdicionados, a Justiça Federal, entre os anos de 2004 a setembro de 2006, ou seja, em pouco mais de dois anos, viabilizou o pagamento de quase 17 bilhões de reais .
Os pagamentos efetuados por meio de precatórios, decorrentes de condenações da Justiça Federal, foram as seguintes :
2004: R$ 1.979.107.791,00
2005: R$ 2.353.957.038,00
Até setembro de 2006: R$ 3.544.801.298,00
Já as despesas totais com o pagamento de requisições de pequeno valor são as seguintes:
2004: R$2.691.206.995,00
2005: R$ 3.876.453.427,00
Até setembro de 2006: R$ 2.284.806.775,00
Número de beneficiários: 523.600 623.495 474.375Número de processos: 346.672 466.980 328.654 Valor médio/beneficiário 5.139,81 6.217,30 4.816,46
Conclui-se do quadro acima que houve crescimento de 44% no volume de recursos pagos entre 2004 e 2005. Mais de um milhão e meio de pessoas foram beneficiadas no período de 2004 a setembro de 2006, em condenações que ficam, na média, em torno de R$ 5 mil, o que demonstra a dimensão social da atuação da Justiça Federal.
Sem embargo da eficiência demonstrada pela leitura dos dados acima, conforme os indicadores estatísticos que constam do banco de dados Justiça em Números, gerido pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ, a Justiça Federal, quando comparada com as Justiças Estadual e do Trabalho, é sobremaneira pequena quanto ao número de órgãos e juízes, embora o seu estoque de processos seja equivalente aos desses dois segmentos do Poder Judiciário. A Justiça Federal possui apenas 1.315 juízes, enquanto a Justiça Estadual tem 10.530 juízes e a do Trabalho, 2.763. Por outro lado, são 27 Tribunais de Justiça, 24 Tribunais Regionais do Trabalho e apenas cinco Tribunais Regionais Federais, de modo que são 1.431 desembargadores estaduais, 486 desembargadores do trabalho e apenas 139 desembargadores federais. Isso decorre do fato de as Justiças Estadual e do Trabalho, já há algum tempo, terem implementado os seus projetos de expansão, especialmente quanto ao processo de interiorização, mediante a criação de varas nas cidades do interior e nas periferias das grandes cidades.
Essas considerações, por si só, demonstram que a expansão da Justiça Federal é necessária e urgente, a fim de que seja possível aprimorar a prestação da atividade jurisdicional em um País marcado por desigualdades sociais e que, para piorar, e muito, essa situação, infelizmente tem o Poder Público como o seu litigante-mor.
Se no Brasil a litigiosidade alcança a impressionante cifra de pouco mais de 30 milhões de ações , mais de 10,7 milhões são só na Justiça Federal . Havia, em setembro de 2006, em primeira instância, 1.208 cargos providos de juiz federal e, na segunda instância, 136 cargos providos de desembargador federal. Sendo assim, é obtida a média de 8.055 processos por magistrado no primeiro grau e 6.985 processos por magistrado de segundo grau.
Registre-se, por oportuno, que o número excessivo de feitos por magistrado se dá pelo aumento de ações novas distribuídas. A distribuição na primeira instância, em 1998, foi de 838.643 ações, pulando para 2.538.362 no ano de 2005, perfazendo aumento de mais de 200%. Nos Juizados Especiais, o cenário é mais grave: foram ajuizadas 213.709 ações em 2002, número que atingiu 1.421.702 em 2005, em crescimento de quase 600%. Nas turmas recursais, foram 172.743 recursos distribuídos em 2004, montante que atingiu 315.346 no ano de 2005, apurando-se crescimento de mais de 100%. Nos tribunais, houve incremento de 46% no período de 1995 a 2005, passando, respectivamente, de 285.749 para 409.274 novos recursos aforados.
Aliado ao crescente número de novos processos, houve expressivo incremento na produtividade dos magistrados. Na primeira instância, excluídos os Juizados Especiais Federais, a relação entre processos distribuídos e processos julgados passou de 59%, em 1998, para 79%, em 2005. Nos Juizados Especiais Federais, a proporção foi de 77% para 94% no período de 2002 a 2005. Nas turmas recursais, entre 2004 e 2005 o percentual elevou-se de 66% para 94%. Nos Tribunais Regionais Federais, a relação foi de 69% em 1995, atingindo 102,5% em 2005.
Nos tribunais, uma das medidas adotadas para atender a alta demanda tem sido a convocação de juízes federais de primeira instância para o auxílio aos magistrados de segundo grau, regulado pela Resolução nº 210 do CJF. A solução foi oportuna, mas, a longo prazo, como verificado na prática desde 2000, teve reflexos negativos sobre a primeira instância, uma vez que o juiz convocado deixa de cuidar dos processos de sua vara. Ademais, na maioria das vezes, a estrutura utilizada pelos juízes em auxílio é a de suas varas, desfalcando de modo sobremaneira a prestação jurisdicional no primeiro grau. Esse aspecto, inclusive, foi bem salientado pelo Ministro Ari Pargendler do Superior Tribunal de Justiça, então coordenador-geral da Justiça Federal, ao encaminhar para o colegiado proposta de ampliação do número de membros das cortes regionais.
Cabe registrar a situação vivenciada pelos Juizados Especiais Federais, previstos pela Lei nº 10.259/01, sem a criação dos necessários cargos para o seu funcionamento, o que foi em parte equacionado pela Lei nº 10.772/03. O mesmo não se pode dizer das Turmas Recursais, até o momento não dispondo de estrutura adequada para atuação, porquanto ainda não foram criados os cargos dos juízes que atuam nesses órgãos.
Observa-se que o aumento substancial da produtividade dos juízes federais não se mostra suficiente para a diminuição do acervo de processos, pois a estrutural atual é insuficiente para dar conta do estoque de ações.
O mais preocupante é que, caso não seja promovida a necessária expansão/crescimento da Justiça Federal, em curto espaço de tempo o seu funcionamento estará irremediavelmente comprometido, em prejuízo de milhares de pessoas que necessitam de seus serviços para uma existência digna, como são os casos dos segurados da previdência social e mutuários do sistema financeiro da habitação, os maiores clientes dos juizados especiais federais.
Um dos principais obstáculos à ampliação da Justiça Federal de primeiro e segundo graus era de ordem financeira, considerando os limites de gastos com pessoal da Lei de Responsabilidade Fiscal, materializados na Resolução nº 05 do CNJ. Assim é que apresentado pela AJUFE o Pedido de Providências nº 165, a partir de coordenação da Ministra Ellen Gracie, Presidente do Supremo Tribunal Federal, e do Ministro Raphael de Barros Monteiro, Presidente do Superior Tribunal de Justiça, com os demais Presidentes de Tribunais Superiores, equacionou-se o problema definitivamente, arbitrando-se à Justiça Federal margem de expansão condizente com suas necessidades, como se observa da Resolução nº 26/2006.
Sobre a necessidade de serem assegurados recursos indispensáveis ao crescimento da Justiça Federal, merece destaque o voto do Ministro Vantuil Abdala, Conselheiro do Conselho Nacional de Justiça, relator do Pedido de Providências 165:
(...)19. As necessidades atuais da Justiça Federal autorizam seja realizada nova readequação nos limites da Resolução na 05 do CNJ, até porque a disponibilidade orçamentária em vigor inviabiliza até a implantação do Plano de Cargos e Salários dos servidores, em prejuízo de todo o Poder Judiciário Nacional.2O. Em reunião administrativa realizada no Supremo Tribunal Federal; em 04/12/2006, Presidida pela Ministra Ellen Gracie e dom a presença dos Presidentes do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Superior do Trabalho, ficou acertada a necessidade de se readequar os percentuais dos limites de despesas com pessoal e encargos dos diversos órgãos integrantes da Resolução nº 5, sob pena de se inviabilizar o processo futuro de ampliação dos diversos segmentos do Poder Judiciário.(..)
Note-se que o Conselho Nacional de Justiça, criado pela EC nº 45/04, é o órgão central de coordenação e planejamento do Poder Judiciário. Esse órgão já identificou as carências existentes na Justiça Federal de primeiro e segundo graus e determinou as providências indispensáveis à alocação de recursos indispensáveis ao seu crescimento.
Há em tramitação dois projetos de lei no Congresso Nacional que cuidam da ampliação da Justiça Federal: o PL nº 4694/04 e o PL 5829/05, tratando, respectivamente, da estruturação das Turmas Recursais e Corregedorias e da criação de Varas Federais. Resta, ainda, o Projeto de Emenda Constitucional nº 544/2002 e o projeto de aumento do número de membros dos Tribunais Regionais Federais, em estudo pelo Conselho da Justiça Federal.
Ocorre que uma das medidas anunciadas no Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, foi a proposta de introdução do art. 71-A a Lei de Responsabilidade Fiscal (LC nº 101/00), nos seguintes termos:
“Art. 71-A. A partir do exercício financeiro de 2007 e até o término do exercício de 2016, a despesa com pessoal e encargos sociais da União, para cada Poder e órgãos referidos no art. 20, não poderá exceder, em valores absolutos, ao valor liquidado no ano anterior, corrigido pela variação acumulada do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA, ou o que venha a substituí-lo, verificado no período de doze meses encerrado no mês de março do ano imediatamente anterior, acrescido de um e meio por cento.”
Na prática, essa medida, que está encartada no PLC 1/2007, importa restrição absoluta ao crescimento da Justiça Federal, impedindo-a de prestar adequadamente a jurisdição.
Os números de distribuição e julgamento de processos antes referidos, nas duas instâncias e nos Juizados Especiais Federais demonstram que a estrutura da Justiça Federal trabalha no limite de sua capacidade.
Ora, ao autorizar o índice de aumento da despesa de pessoal sobre os valores absolutos liquidados do exercício anterior, pela variação do IPCA (até março do exercício anterior) acrescido de 1,5%, no período de 2007 a 2016, o projeto de lei complementar se mostra mais restritivo do que o legislador originário da Lei de Responsabilidade Fiscal, que previu a margem de expansão de 10% nos três primeiros exercícios subseqüentes à vigência da citada lei.
A média histórica do IPCA no período de 2004 a 2006 foi a seguinte:
2004: 7,60%2005: 5,69%2006: 3,14%
Do quadro acima conclui-se que a variação do IPCA reduziu-se em mais de 100% no período de 2004 a 2006 e esse percentual permanece em declínio constante. Assim sendo, a margem prevista pelo art. 71-A do projeto em causa ficará muito abaixo dos 10% originais e prudentemente estabelecidos na Lei de Responsabilidade Fiscal. Pode-se chegar a variação negativa do índice a reclamar, na contramão do exposto, a inconseqüente redução da despesa.
Some-se a isso o fato de o projeto agregar aos valores globais de despesa com pessoal o gasto com pessoal terceirizado, agora colocado de forma expressa no § 3º do projeto, restringindo mais ainda os encargos globais com pessoal qualificado e especializado, indispensável ao bom desempenho da Justiça como um todo.
Assim sendo, o que se propõe é que o projeto de lei complementar ressalve os projetos de lei de ampliação da Justiça Federal, quais sejam: o de criação de varas federais (PL 5829/05), de estruturação das Turmas Recursais e Corregedorias (PL nº 4694/04), de criação de novos tribunais regionais federais (PEC 544/2002) e o projeto de aumento do número de membros dos Tribunais Regionais Federais, em estudo pelo Conselho da Justiça Federal. Além disso, também de modo a evitar restrições ao crescimento futuro da Justiça Federal, o art. 71-A proposto deve substituir o percentual de 1,5% pelo percentual de 10%.
Com essas alterações, a ser promovidas pelo Poder Legislativo no cumprimento de sua missão constitucional, contorna-se o vício de inconstitucionalidade do Projeto de Lei Complementar nº 1/2007, porquanto não impede a programação estratégica do Poder Judiciário. Por outro lado, preserva-se a essência do PAC, qual seja, a adoção de medidas para a promoção do crescimento, sem, com isso, comprometer de forma inaceitável os relevantes serviços sociais, econômicos e políticos prestados pela Justiça Federal, principalmente quanto ao atendimento das demandas encaminhadas pelas pessoas mais carentes, ávidas quanto ao reconhecimento de seus direitos mínimos, indispensáveis para assegurar uma vida com alguma dignidade.
Por oportuno, apresento a Vossa Excelência, em nome da Associação dos Juízes Federais do Brasil – AJUFE, a nossa mais alta admiração e estima.
Atenciosamente,
Walter Nunes da Silva JúniorPresidente da Ajufe
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